Em um programa de domingo a tarde, uma marca chinesa apresentou um hatch que mexeria com o mercado brasileiro e mudou muita coisa nos anos seguintes. Este é o JAC J3, em 2011 apresentado por Fausto Silva, que colocou um carro Made In China na garagem de muita gente e fez muita montadora tradicional rever seu catálogo ou, ao menos, o pacote de equipamentos deles. A história se repete com este chinês, o BYD Dolphin Mini.
Não é o primeiro lançamento da BYD no Brasil, mas o Dolphin Mini tem credenciais para fazer ainda mais que o Dolphin no mercado por sua faixa de preço e a quem ele vai se tornar opção. E foi apresentado pela primeira vez em um programa de domingo, na mesma emissora, por outro apresentador e, com certeza, fará bem mais que o JAC J3 nesta nova fase das chinesas por aqui.
O BYD Dolphin Mini não será necessariamente barato e de fácil acesso para a maior parte da população. Além dos R$ 115.800, que já não é um valor baixo diante da vida financeira de boa parte do país, o ideal é ainda ter um ponto de recarga em casa e um uso diferente de um hatch compacto tradicional. Mas esse carro elétrico foi pensado para chamar a atenção de quem, muitas vezes, nem consideraria ter um elétrico neste momento.
A BYD tem investido pesado em popularizar sua marca, principalmente na TV aberta em horários nobres. A aparição do Dolphin Mini em um dos programas de maior audiência pode não reverter em vendas para a maioria do público que está do outro lado da tela, mas despertou a curiosidade de muita gente ao menos para conhecê-lo. E outra parte pode ter feito a reserva do seu naquele momento. É o risco do negócio.
E a BYD trouxe um bom produto para isso. O Dolphin Mini, na China chamado Seagull, vai surfar na onda do irmão maior para também ter sucesso - sei que são nomes marítimos, desculpem o trocadilho. A plataforma é a mesma, a e-Platform 3.0, uma base dedicada aos elétricos da BYD e que como em seu irmão maior, é o que dá ao pequeno carro algumas vantagens.
Em dimensões, o Dolphin Mini tem 3.780 mm de comprimento, 46 mm maior que um Renault Kwid (3.734 mm), mas seus 2.500 mm de entre-eixos o colocam na mesma faixa dos hatches compactos, como o Hyundai HB20 (2.530 mm), VW Polo (2.566 mm) e Chevrolet Onix (2.551 mm). Em largura, são 1.715 mm, medida também próxima aos compactos, e a altura de 1.580 mm é até um pouco maior. Ou seja, ele flutua entre os dois segmentos de hatches, subcompactos e compactos. Abaixo, uma tabela comparativa.
DOLPHIN MINI | DOLPHIN | KWID E-TECH | HB20 | |
Comprimento | 3.780 mm | 4.125 mm | 3.734 mm | 4.015 mm |
Entre-Eixos | 2.500 mm | 2.700 mm | 2.423 mm | 2.530 mm |
Largura | 1.715 mm | 1.770 mm | 1.720 mm | 1.720 mm |
Altura | 1.580 mm | 1.570 mm | 1.500 mm | 1.470 mm |
Porta-malas | 230 litros | 245 litros | 290 litros | 300 litros |
Isso trouxe ao Dolphin Mini um espaço interno similar ao dos hatches compactos, já que a base elétrica permitiu que os eixos fossem colocados nas extremidades, mas por enquanto está homologado para quatro ocupantes e, o quinto, ficará bem apertado quando for possível o colocar no carro. O porta-malas é prejudicado nessa equação, com 230 litros pelo menor comprimento do carro, sendo que nem estepe ele possui - um kit de reparo está em uma bolsa que acaba ficando jogada no porta-malas, sem um lugar para fixação.
Comparado ao Dolphin, o irmão menor tem um estilo mais definido e próprio, com cortes retos em faróis e parachoques, uma lateral com linha dos vidros que sobe em direção a traseira, as lanternas que estão interligadas e um spoiler na tampa bastante avançado. Não há limpador traseiro, o que é um problema em dias de chuva e não prejudicaria seu visual limpo caso fosse equipado. E na dianteira, um único braço, ainda que eficiente.
O BYD Dolphin Mini nasceu para ser o mais barato em todos os seus mercados. O acabamento tem plástico rígido em diversos pontos, mas boa montagem e pontos com tecidos e couro, neste caso, azul e preto. É um padrão que está nos hatches compactos com pontos mais refinados, como esta escolha de variação de materiais, e bancos confortáveis em um desenho que remete até a certa esportividade.
Como o Dolphin, o interior investe em elementos tecnológicos, mas em uma proporção menor e mais barata. A tela central, por exemplo, segue rotativa, mas com 10,1" (12,8" no Dolphin), um bom tamanho para o porte do carro, mas segue sem o espelhamento sem fio, tanto Android Auto quanto Apple CarPlay. O software é o mesmo, com boa velocidade de operação, mas insiste em uma certa dificuldade para ajustes, como ar-condicionado, quando está usando algum espelhamento na tela.
Para os instrumentos, uma peça que mistura indicação por LEDs para velocidade, nível de carga e autonomia, com uma pequena tela digital para computador de bordo. É um conjunto mais barato que a tela completa do irmão maior e que, pelo tamanho, tem que acostumar para fazer a leitura da velocidade. Funcional, mas sei que muitos esperavam algo melhor. O ar-condicionado, apesar de estar na tela, não tem ajuste automático de temperatura.
Os chineses evoluíram muito na construção de seus carros. Com aprendizados, conseguem apresentar produtos muito melhores que no passado e para brigar com as tradicionais. O Dolphin Mini é bem construído e se percebe quando está ao volante, com uma boa estrutura, alinhamento de peças e trabalho do conjunto completo de suspensão e direção. Disse bom, não perfeito, e guarde essa informação.
Por conhecer o Dolphin, já tinha algumas expectativas sobre o Dolphin Mini. Eles usam a mesma plataforma e sei que a BYD não apostaria errado no carro que vai fazer suas vendas aumentarem consideravelmente e quer roubar clientes dos clientes das marcas tradicionais que compram hatches em versões mais completas.
O motor dianteiro tem 75 cv (55 kW) e 13,8 kgfm, como sempre disponíveis de forma imediata. As baterias Blade, LFP, tem 38,8 kWh (37 kWh úteis), com autonomia homologada no Brasil de 280 km e recarga em até 6,6 kW em AC e 40 kW em DC, com capacidade de ir de 30 a 80% em apenas 30 minutos. São números que não se destacam entre carros elétricos no geral, mas vão bem nesta faixa de entrada.
Na cidade, apesar dos números semelhantes ao modelos 1.0 aspirados, o Dolphin Mini se aproveita do torque imediato para ser ágil. O seletor de modos de condução varia em Eco, Normal e Sport, sendo que mesmo o mais eficiente entrega desempenho suficiente para o uso urbano. Com 1.239 kg, tem bom peso para um carro elétrico nesse porte e colabora para esse desempenho.
Apesar da autonomia homologada ser de 280 km, o Dolphin Mini vai além no uso real. Em nosso teste, a média urbana foi de 9,5 km/kWh, ou uma autonomia na faixa dos 350 km considerando os 37 kWh úteis, sem sacrificar ar-condicionado ou vias expressas, por exemplo. Ponto positivo é que o Dolphin Mini tem regulagem de profundidade e altura na coluna de direção e de altura para o banco do motorista, elétrico, que facilita na hora de achar uma boa posição de dirigir, que mesmo no mais baixo, é mais elevada que em hatches tradicionais. Por outro lado, isso traz uma posição de boa visibilidade com o grande parabrisa e vidros laterais dianteiros.
Para o uso urbano, o Dolphin Mini é bem confortável. Bancos, posição de dirigir, peso de direção, respostas de motor e freios deixam o compacto fácil de ser dirigido mesmo para quem não está acostumado com carros elétricos, um bom ponto para conquistar novos clientes com menor cansaço no fim do dia - o fato de um elétrico não ter vibrações ou ruídos de motor também colabora nessa sensação de conforto.
O que incomoda no Dolphin Mini é o ajuste de suspensão. Como vem da China sem mudanças, o acerto é bem característico daquele mercado, muito voltado ao conforto e menos dinâmico. A dianteira é até boa e não reclama tanto nos buracos, mas a traseira é muito macia e, mesmo em baixas velocidades, balança bastante e chega a incomodar os ocupantes traseiros e cria uma dinâmica esquisita em curvas durante curvas mais rápidas. Os pneus 175/55 nas rodas de 16" não são fáceis de encontrar no mercado e a altura baixa da banda lateral pode se tornar um problema nos buracos mais agressivos.
Sua velocidade máxima é limitada a 130 km/h, segundo a BYD, mas no modo Eco vai aos 100 km/h e, mesmo no Sport, ele demora para ultrapassar esse número - a retomada de 80 a 120 km/h não foi concluída por falta de espaço. O que ele faz é o suficiente para aquele deslocamento rápido em rodovias entre cidades ou vias expressas urbanas, mas não muito além disso. Este é um ponto importante a ser considerado na hora da compra, além do espaço para quatro ocupantes e porta-malas de 230 litros.
O BYD Dolphin Mini se posiciona em uma faixa de preço onde os hatches compactos já usam motores turbo, alguns com câmbio automático, e de melhor desempenho. O Dolphin Mini chegou aos 100 km/h em 14,9 segundos, como divulgado pela marca, número de 1.0 aspirado a combustão. Além disso, tem a limitação do uso na estrada, porta-malas e espaço para quatro pessoas.
O compacto tem boas qualidades. É uma opção válida para entrar no segmento de elétricos, mas o comprador precisa avaliar bem seu uso e o acesso a carregadores - se possível, ter um em casa ou no trabalho -, mas isso é algo comum entre os EVs e o momento de comprá-los. A suspensão tirou um pouco do brilho do carro, mas longe de o apagar, principalmente pelo restante do conjunto.
Por R$ 115.800, tem chave presencial, faróis em LEDs, piloto automático, 6 airbags e outros itens, mas não trouxe nenhum ADAS para não o aproximar e prejudicar as vendas do Dolphin ou Dolphin Plus. É um pacote competitivo no mercado em geral e deve emplacar mais que o irmão maior e ser o elétrico mais vendido com certa folga. Só que ainda não será necessariamente uma ameaça aos hatches tradicionais em um mercado que ainda se acostuma aos elétricos e algumas limitações existentes.
Fotos: Mario Villaescusa (para o Motor1.com)
BYD Dolphin Mini (38,8 kWh)
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