Com quase 20.000 unidades vendidas em 2023, os veículos elétricos rapidamente ganham relevância no Brasil. Mas e o mercado de carros elétricos usados? Com uma frota relativamente nova, são naturais as dúvidas sobre o seu uso, durabilidade e confiabilidade ao longo de muitos quilômetros. Para entender melhor, recebemos um JAC e-JS1 com mais de 120.000 km rodados para avaliação na vida real.
Este JAC e-JS1 branco tem uma história, ao ser utilizado por um cliente e depois recomprado pela própria JAC para ver como o carro se comportou depois de tanto rodar. Pintura e acabamentos interno e externo estão em bom estado considerando a quilometragem, apenas com as rodas bastante raladas em suas bordas, sinal de falta de cuidado na hora de estacionar.
Desenvolvido em parceria com o Grupo Volkswagen, o JAC e-JS1 é um subcompacto elétrico equipado com um motor de 45 kW (62 cv) de potência e 15,3 kgfm de torque montado no eixo dianteiro. Ele é alimentado por baterias de lítio-ferro-fosfato com 30,2 kWh de capacidade (31 kWh brutos), o que dá uma autonomia teórica de 302 km pelo ciclo WTLP. Pelo Inmetro, são 161 km de alcance, um número modesto que na prática se revela melhor.
A unidade testada é um JAC E-JS1 2021/2022 que foi comprado em Divinópolis/MG em dezembro de 2021 por R$ 145.000. Ao longo de 18 meses, o dono rodou 117.000 km, fazendo em média 390 recargas elétricas, sendo quase todas na residência do proprietário, que possui painéis solares, antes de vendê-lo novamente para a JAC.
Hoje, mesmo com 120.000 km rodados, o e-JS1 não apresentou os famosos grilos, barulhos chatos na suspensão ou de peças soltas no interior. O acabamento, de forma geral, permanece bem cuidado, a não ser pela aparência um pouco desgastada no suporte do console central. Bancos, painel, painéis de porta e teto, tudo em ordem e com impressão similar ao do zero.
Coincidentemente, na mesma semana retirei também um JAC e-JS1 EXT, a versão aventureira para outra avaliação. Comparando os dois, achei o e-JS1 normal melhor, principalmente na cidade. Os pneus ruidosos do EXT e o visual mais "parrudo" não me agradaram tanto - normal fez mais sentido. Aliás, rodando com os dois no dia a dia, o JAC usado não deixou nada a desejar em termos de comportamento, ruídos internos, suspensão e dirigibilidade em geral. Em alguns pontos, parecia até melhor que o mais novo.
De fato, o pequeno JAC dá conta do recado no uso urbano. Não se deixe enganar pelos números de potência e torque. Ele acelera muito bem, condizente com os 10,7 segundos declarados para o 0 a 100 km/h e tem retomadas espertas, sobretudo nos trechos urbanos. Além disso, o comportamento dinâmico é aceitável considerando sua proposta de modelo de entrada. Não é macio demais e a direção tem boa resposta, ainda que o curso da suspensão seja curto e o carro pule um pouco nas pistas onduladas, mas não chega a desabonar.
O interior tem aparência contemporânea e acabamento bom para sua proposta. Quadro de instrumentos digital, central multimídia com tela de 10,25", bancos com acabamento em couro ecológico, freio de estacionamento eletrônico e sistema de som com qualidade razoável. Ficou devendo espelhamento por Android Auto/Apple CarPlay, mesmo com fios, e um carregamento por indução no console, que está disponível em outros mercados.
Para aproveitar o fim de semana, resolvi fazer um bate e volta até o litoral e aproveitar para testar o carro elétrico usado em uma viagem curta, de pouco mais de 120 km. Não custa lembrar que se trata de um carro urbano em sua concepção, o que também não quer dizer que seja impossível encarar trechos rodoviários curtos.
Bateria carregada, o e-JS1 caiu na estrada. Com velocidade máxima limitada a 110 km/h, conseguiu acompanhar o fluxo no trecho inicial sem sufoco, também pelo tráfego intenso e pela boa capacidade de retomada. No segundo trecho, com rodovia de pista simples, o trânsito ficou congestionado na maior parte do tempo, o que atrasou a viagem, mas aliviou o consumo de energia. Fora do seu habitat natural, o pequeno JAC vai bem nas rodovias de pista simples, ultrapassa rápido e anda com tranquilidade no limite de velocidade, que normalmente é de até 100 km/h, mas não vá além disso.
No final do dia, preparando a volta para São Paulo (SP) o primeiro ponto de recarga disponível, na Riviera de São Lourenço, estava com falha na comunicação, tornando inviável o carregamento, e os demais pontos ocupados. Havia a opção de parar 10 km adiante, mas como se tratava de um carregador lento e instalado em supermercado, decidi seguir na SP-55 até chegar ao destino programado em Santos (SP).
Com 90 km de autonomia estimada e 38% de capacidade da bateria, calculei que seria suficiente pra chegar ao destino, um trajeto programado de 53 km. No entanto, quando atingiu 20% de capacidade, começaram a acender os alertas de carga da bateria e, menos de 3 km depois, quando a capacidade indicada estava em 14%, o sistema deu um último alerta de carga em estado crítico e o carro foi baixando a velocidade até parar completamente.
Paramos no acostamento e por sorte havia um posto de gasolina a menos de 100 metros. Como estávamos em três pessoas, conseguimos empurrar o carro até um canto e pedimos uma tomada "emprestada" para carregar o carro elétrico. Depois de cerca de uma hora e meia na tomada 220V, foi possível chegar a 18%.
Como o posto estava fechando, saímos do local e seguimos até o carregador mais próximo, 6 km, para carregar um pouco mais, o bastante para chegar a Santos e, aí sim, parar em um local com funcionamento 24 horas e recargar o suficiente para voltar a São Paulo. No final, a missão foi cumprida e chegamos em São Paulo já de madrugada após a peregrinação por conta da "falha" de informação sobre o estado da bateria.
Após esse episódio, não deixei mais a carga ficar abaixo de 25% e o carro não apresentou qualquer anomalia referente a isso. No entanto, consideramos uma falha grave a informação sobre o estado de carga não ser confiável e há relatos de outros donos de e-JS1 onde a bateria apagou com 10 ou 15% da carga.
Em termos de consumo, o e-JS1 não decepcionou, entregando médias esperadas para o seu porte, motorização e bateria. Na cidade, ficou entre 11 e 12 kWh/100 km (8,3 e 9,1 km/kWh) e durante a viagem ao redor dos 14 kWh/100 km ou pouco mais de 7 km/kWh. Na prática, uma autonomia de 250 a 260 km no uso urbano e de 200 a 220 km na estrada, sem abusar.
Quando o carro foi retirado, a estimativa no painel era de 293 km com 100% de carga. Essa redução em relação aos 300 km de um modelo novo se deve pela degradação de menos de 3% da bateria após os 120.000 km, segundo informado pela própria JAC. No fim das contas, uma perda aceitável em comparação ao modelo 0km.
Se rodando no dia a dia o e-JS1 se saiu bem, resolvemos conferir melhor como ficou o estado dos componentes mecânicos do carro elétrico e contatamos nossos amigos da oficina Juca Bala Racing, especializada em importados, para colocar o carro elétrico usado no elevador e fazer uma verificação mais detalhada com um especialista.
O Bruno, que nos atendeu nessa missão, verificou o estado geral da parte inferior. A não ser por alguns arranhões na chapa de proteção de bateria (o que é perfeitamente normal), a conservação de peças estava muito boa para um carro com essa quilometragem. "De modo geral, as peças estão íntegras, uma surpresa para um carro com essa quilometragem", disse Bruno.
No caso, estava se referindo aos componentes da suspensão como buchas, batentes, molas e amortecedores, todos em ótimo estado. Também chamou a atenção a conservação dos discos e pastilhas de freios para um carro que já rodou bastante, mérito dos veículos elétricos, que poupam bastante o sistema graças à frenagem regenerativa.
Acostumado aos carros a combustão, sobretudo importados e com motores de alto desempenho, Bruno acelerou o e-JS1 e ficou surpreso com o torque instantâneo, a agilidade e a rodagem sem ruídos, seja de motor ou de componentes, considerando ainda o fato de ser um carro com 120.000 km rodados.
Em resumo, tudo em ordem com as peças ainda originais e supreendentemente em bom estado de conservação. A única falha encontrada foi um vazamento de óleo (sim, os carros elétricos usam lubrificantes em muitos componentes) entre o motor elétrico e o eixo da transmissão. Algo que precisará de reparo, mas não comprometeu o uso.
Comprado por R$ 145.000, o mesmo JAC e-JS1 hoje custa R$ 126.900, ficando um pouco mais acessível, mas o segmento está ficando competitivo e futuros lançamentos podem jogar a faixa de entrada para mais perto de R$ 100 mil, o que colocará em xeque o posicionamento deste e dos rivais. No mercado de seminovos já é possível encontrar exemplares por R$ 99 mil, valor que deve cair ainda mais no médio prazo.
Tudo considerado, o JAC e-JS1 usado surpreendeu pelo estado de conservação e pela rodagem praticamente de carro 0Km. No dia a dia se revelou um carro elétrico honesto e não apresentou qualquer anormalidade no uso normal, a não ser a falha grave de informação sobre o estado de carga da bateria e que não parece ser exclusivo da unidade avaliada.
Questões específicas do e-JS1 à parte, a avaliação abriu horizontes sobre o uso de carros elétricos ao longo do tempo. É claro que a manutenção correta e o cuidado no uso interferem bastante, mas temos aqui um exemplo real de que esses veículos podem ter uma durabilidade superior aos modelos equivalentes a combustão.
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