Teste Ford Mustang Mach-E: elétrico merece ser chamado de Mustang?
Potência e dirigibilidade de esportivo ele tem; o que falta para te convencer?
A Ford arriscou bastante ao batizar um carro elétrico como Mustang. Nome icônico, é ligado diretamente a um esportivo com motor V8, barulhento, queridinho dos puristas e que nada tem a ver com carros elétricos, mas também um nome forte o suficiente para sustentar uma família de modelos. E se o Mustang tradicional ainda existe com motorzão a combustão, agradeça ao Mach-E.
Independente do nome, este Mustang Mach-E é importante. Ganhou o mundo como o primeiro carro elétrico da montadora e se posiciona contra os Tesla ao aproveitar a tradição de nome tanto da marca quanto do modelo. No Brasil, chega a versão topo de linha, GT Performance AWD Extended Range, um pacote de cerca de US$ 60 mil nos Estados Unidos e R$ 486 mil por aqui. Parece loucura, mas esse posicionamento é, digamos, interessante.
Nem Mustang cupê, nem SUV
A Ford até categoriza o Mach-E como um SUV, mas não é bem assim. Tem 1.613 mm de altura, mas a altura do solo não é tão elevada e, sim, se não tomar cuidado, dá para raspar o parachoque dianteiro em algumas saídas de garagem ou a parte de baixo do carro em lombadas. Abra as portas e entenda que essa altura do Mach-E é um pouco artificial.
A base do Mustang Mach-E foi desenvolvida para veículos elétricos sobre a plataforma C2, uma das mais modernas da Ford no mundo. Entre os eixos, o conjunto de baterias de lítio com 376 células, 12 módulos e 596 kg. Para não ficar algo aparente ou muito baixo, dá para perceber que o projeto e montagem do interior veio em seguida, acima das baterias, e cria um degrau que é escondido pelas portas.
É um carro com 4.743 mm de comprimento e 2.984 mm entre os eixos. A vantagem da base elétrica é permitir os eixos mais próximos das extremidades da carroceria, o que melhora as possibilidades em espaço interno. É estranho falar em algo com nome de Mustang elétrico, mais ainda com usabilidade familiar, quatro portas e confortável, mas um ponto interessante do Mach E é justamente isso.
Não tem como comparar a sensação do Mustang tradicional, com teto baixo e vidros pequenos, porém o Mach-E traz um pouco disso, como a posição de dirigir em relação a pedais e volante. Está mais para um hatchzão, principalmente pelo habitáculo começar em uma espécie de segundo andar da plataforma. Na versão GT Performance, os bancos esportivos te abraçam com dose de conforto, mas não esquece o que esse carro pode fazer.
O mais surpreeendente é você dizer que tem um Mustang e poder levar adultos no banco traseiro, entrando por portas próprias, com bom espaço para pernas e cabeça, piso plano e até saídas de ar-condicionado. No porta-malas com acionamento elétrico, capacidade de 402 litros, mas há um na dianteira de 139 litros que pode, inclusive, encher de gelo pois há uma drenagem, ou para levar o carregador de emergência, por exemplo. É um Mustang usável.
Para brigar com a Tesla, coisas de Tesla
A qualquer parada que fazia com o Mustang Mach-E, alguém perguntava que carro era aquele. Afinal, ele não tem nenhum logo da Ford e, claro, não é o Mustang que conhecemos. O Mach-E tenta, com os faróis em LEDs finos, as linhas largas nas laterais, o capô longo e vincado, as lanternas com três ranhuras tão características e, nesta versão, os parachoques com entradas e saídas de ar posicionadas para ajudar na aerodinâmica, inclusive ativa na grade inferior.
Por dentro, temos a mistura do digital com analógico e onde ele menos trouxe do Mustang tradicional. Há peças que vemos em outros Ford, como chave de seta, seletor do câmbio e botões de vidros e retrovisores elétricos, mas há uma clara tendência que outra empresa norte-americana trouxe ao mundo e diversas estão na onda: telas e mais telas.
Para a briga ao redor do mundo com a Tesla, a Ford trouxe um interior mais moderno. O painel de instrumentos de 10,2" concentra as informações necessárias para a condução, como velocidade, autonomia, nível de carga das baterias e assistentes de condução. Ao lado, uma tela vertical de 15,5" concentra as demais funções do carro, como espelhamentos sem fios, navegação, ar-condicionado, sistema de som (assinado pela Bang&Olufsen) e ajustes, como seletor de modos de condução e regeneração.
O sistema SYNC4 é rápido e funciona bem. Dá para encontrar as principais funções na tela ou, se não, em algum menu de fácil acesso, além da velocidade de respostas e conexão com smartphone pelo espelhamento sem fios. Em quase um mês com o Mach-E, já era natural a integração com o que precisava da tela. Um botão físico está ali com diversas funções, como volume do som e intensidade da ventilação. Apesar de grande, a parte inferior da tela fica para as funções mais importantes.
O acabamento é digno de um carro desse preço. As portas não tem as maçanetas tradicionais, que estão escondidas nos puxadores das portas. Tem algum plástico rígido, mas o que carrega não faz dívida com modelos de marcas premium e curiosas soluções, como o mesmo acabamento que vai nos alto-falantes passando pelo painel inteiro.
No exterior, o Mach-E tem um sistema de condução mais avançado, cobrado como opcional e para o uso. No Brasil, o sistema já funciona muito bem e se comporta como os mais avançados das marcas premium. Mais uma vez, pensaram em como a Tesla conquistou clientes e trouxeram algo para tirar essa vantagem sob uma marca tradicional.
É justo ser um Mustang?
Para receber a sigla GT, o Mustang Mach-E troca seus motores, um em cada eixo, por mais potentes. São 487 cv e 87,7 kgfm distribuídos de forma automática pelo eAWD, números superiores ao Mustang Mach1 vendido no Brasil, ainda da geração anterior. Entre os eixos, a bateria de 98,7 kWh (91 kWh úteis), que aceitam até 11 kW em AC e 150 kW em DC.
Além da potência, o Mach-E tem pontos em comum com o Mustang tradicional. A usabilidade do elétrico vem com os modos de condução Engage (equivalente a um equilibrado), Whisper (para pisos de baixa aderência) e Unbridle (esportivo), que atuam nas respostas do acelerador, motores e na suspensão adaptativa para cada situação. E sim, o Mustang tradicional é, entre da sua categoria, um carro que vai bem no uso, apesar do perfil esportivo.
O Mach-E é equilibrado, apesar da potência disponível. O acelerador amansado do modo Engage é fácil de modular e, se precisar, afunde o pé e ele joga a potência nas rodas para uma retomada ou ultrapassagem. É carro de sobra para quem vai se deslocar e, se me permitem reclamar, só a suspensão, mesmo adaptativa, é um pouco dura mesmo quando ajustada para o conforto. O Mustang elétrico não curte ruas esburacadas ou vias com remendos e deixa isso claro com algumas batidas secas que doem na alma.
O isolamento acústico é composto por muito material e vidros duplos, o que aumenta a sensação de conforto do elétrico. A autonomia é boa, mas apenas pelo tamanho das baterias. No ciclo urbano, registrou 5,3 km/kWh, ou um total de 482 km, que chega ao aceitável pela potência, mas longe de ser chamado de eficiente. Ou você queria mesmo quase 500 cv e 90 kgfm de torque com autonomia de hatch compacto elétrico abaixo dos 100 cv? Acho que não.
Provavelmente serei criticado deste ponto em diante. Sim, o Mach-E merece ser chamado de Mustang. Não tem o ronco do V8 e as sensações de um motor a combustão, mas não diga que ele não anda e se comporta como um esportivo. O modo Unbridle - algo como liberar um cavalo de suas restrições e controle - realmente mostra muito do que ficou escondido nos demais modos.
O acelerador fica muito sensível. Os pneus brigam para segurar todo o torque quando o Mach-E dispara, com um 0 a 100 km/h de 4,2 segundos no nosso teste, e ganha velocidade mais rápido do que você vai perceber no painel. A suspensão está muito mais firme, praticamente travada, e aí ele realmente mostra que aquela coisa de SUV é apenas marketing. Com a tração integral, passa a confiança que não temos com o Mustang tradicional para atacar uma curva e ter uma velocidade de saída digna sem imaginar que a traseira pode atravessar essa conversa.
Os freios assinados pela Brembo, com quatro pistões em cada pinça dianteira, atuam junto com a regeneração e o pedal tem uma boa modulação e resposta quando comparado a outros elétricos. É um carro que anda rápido como seu nome diz e não apenas em linha reta, como vemos em elétricos até mais potentes e baratos, e não nega o DNA que carrega tanto pelo Mustang quanto pelo GT. Ele limita a 200 km/h, algo que não é difícil ele alcançar com certa facilidade e com sobra de conjunto de suspensão e freios mesmo nesta velocidade.
E sei que o texto está longo, mas a realidade de um carro elétrico é essa. Um carro com mais tecnologias, detalhes e pontos a serem explicados. Talvez o Mustang tradicional não precisaria de tantas explicações e isso é sinal da mudança dos tempos. E como a Ford posicionou o Mach-E também é algo a ser explicado.
Por R$ 486 mil, é mais caro que o Volvo C40 Ultimate (R$ 418.950) e seus 408 cv e 67,3 kgfm de torque, e que o BMW iX1 de 313 cv e 50,3 kgfm (R$ 434.950), mas é mais potente. E outros elétricos das marcas premium nesta faixa de potência e torque estão bem acima deste preço - a não ser que você abra mão do premium e queira um BYD Seal (530 cv e 60,2 kgfm) por R$ 296.800.
No fim, a Ford não errou a chamar esse carro de Mustang. Ele permite que a marca faça o V8 ao equilibrar a questão de emissões da linha, mas não abre mão de como se comporta e pode ser dirigido no limite, ao mesmo tempo em que chega para os novos tempos lotado de tecnologias. Não é barato, mas quando um Mustang foi barato?
Fotos: Mario Villaescusa (para o Motor1.com)
Ford Mustang Mach-E GT
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