Diz o ditado que "o que os olhos não veem, o coração não sente". Mas isso pode soar apenas como uma meia verdade no caso do Ora 03 GT, versão mais cara e equipada do hatchback elétrico da GWM que chegou ao Brasil no ano passado. Sua mudança mais pronunciada em relação ao 03 Skin pode parecer apenas visual, mas há outras coisas importantes que não são visíveis ao primeiro olhar.
Passada a euforia com a chegada do BYD Dolphin e a nova realidade de carros elétricos compactos entre R$ 150 mil e R$ 200 mil mais modernos e equipados, a GWM lançou o Ora 03 no Brasil em duas versões, que se diferenciam basicamente pelo visual, acréscimo de equipamentos e, principalmente, pela bateria maior.
O Ora 03 é um dos modelos da Ora, divisão da GWM que vende apenas carros elétricos com nomes de gatos na China, lançado em outros mercados como Good Cat ou Funky Cat. Mesmo na versão de entrada, o elétrico já chama bastante a atenção nas ruas, mas este 03 GT vai além, com rodas de aparência mais esportiva, elementos de acabamento externo em vermelho, aerofólio traseiro destacado, para-choques dianteiro e traseiro mais agressivos, entre outros elementos.
Como já destacamos em outras ocasiões, o visual se caracteriza pelas linhas arredondas e elegantes, ao menos para mim. Essa mistura de estilos, que pode até lembrar outros modelos como Mini ou Porsche, no conjunto da obra agrada bastante, principalmente ao vivo, com o carro elétrico chamando a atenção por onde passa.
Apesar de ser chamado muitas vezes de compacto, o Ora 03 é mais que isso: são 4,25 metros de comprimento, 1,63 metro de altura, 1,84 metro de largura e honestos 2,65 metros de distância entre-eixos, números que o colocariam há alguns anos no mesmo terreno dos nossos conhecidos (e finados) hatches médios.
O espaço interno é bem honesto considerando o seu porte. É melhor ainda na dianteira, com um espaço decente para as pernas do motorista e passageiro e um pouco menos para a cabeça, por conta do teto panorâmico quando comparado ao 03 Skin, mas nada que desabone.
Todas as versões da linha Ora 03 vem equipados com itens como central multimídia de 10,25" com Android Auto e Apple CarPlay sem fio, painel de instrumentos digital de 10,25", câmera 360°, sete airbags, frenagem autônoma de emergência, controle de cruzeiro adaptativo, assistente de ponto cego, sistema de som com seis alto-falantes e mais.
A usabilidade dos sistemas e dispositivos é boa. No entanto, faz falta alguns botões de atalho embaixo da tela, como um acesso direto às definições do ar-condicionado, por exemplo, sem ter que ficar acessando a tela principal. O botão que 'liga/desliga' o carro também fica em uma posição incômoda, na parte inferior esquerda do volante - embora raramente precise ser usado, vale dizer.
No caso específico do GT, há o acréscimo de carregador sem fio para smartphones e abertura da porta por aproximação, bancos dianteiros com função de massagem e ventilação, além de ajuste elétrico com memória para o motorista. Na parte de segurança, ganha frenagem de tráfego cruzado, assistente de estacionamento automático e partida inteligente do motor, bastando posicionar o câmbio na posição D para sair dirigindo, sem precisar apertar o botão Start.
A atmosfera interna continua agradando no GT, sobretudo pelo bom acabamento em preto e cinza escuro com detalhes em vermelho, que fica mais adequado à proposta. No entanto, as cores claras do Skin que variam de acordo com a pintura externa geralmente dão uma maior sensação de amplitude na cabine.
Você se aproxima do carro, as portas se destravam automaticamente. Ao entrar, o painel se ilumina, a tela multimídia liga instantaneamente, já conectada ao seu smartphone, e sua música favorita começa a tocar.
Para dirigir, basta colocar o seletor que fica no console na posição 'D' e sair dirigindo, sem necessidade de acionar botão de partida - há um botão que 'desliga' o veículo, caso queira, no canto inferior esquerdo do painel. No entanto, em algumas situações, embora o carro sempre ligasse imediatamente ao abrir a porta, a "liberação" para poder colocar em D e sair dirigindo acabava levando alguns segundos adicionais, gerando um certo incômodo.
Seletor em 'D', mão no volante, pé no acelerador, o Ora 03 GT é um carro gostoso de dirigir. O compacto está num bom nível de absorção de impactos, a não ser em casos extremos. E mesmo transmitindo conforto, o GWM elétrico está longe de ser um carro molenga, pelo contrário: pouca oscilação, pneus não cantam e a frente não destraciona. O 03 GT é um carro bem assentado, considerando sua proposta. Curiosamente, esta versão me pareceu melhor até mesmo que a Skin nesse quesito. Tudo isso aliado a um bom isolamento acústico da cabine.
Se a dirigibilidade na cidade é o ponto forte, na estrada ele também não decepciona. Logicamente não tem pretensões esportivas, mas o motor de 171 cv e 25,2 kgfm dá conta do recado com ultrapassagens e retomadas bem rápidas. Prova disso é que no nosso teste, foram apenas 7,5 segundos para acelerar de 0 a 100 km/h, tempo ligeiramente melhor que o dado oficial (8,2 segundos).
Os assistentes de condução têm boa precisão no uso geral, sem ser invasivos. Dá pra ajustar o nível de volume dos alertas para quem prefere uma tocada mais silenciosa sem os "apitos" constantes. No entanto, a chave de seta com comando eletrônico é extremamente sensível, se tornando chata nas sinalizações de mudanças de faixa: quase sempre, quando você quer desligar, acaba sem querer ativando o lado oposto, e vice-versa - usei só o toque breve em boa parte do tempo "com medo" de ficar brigando com a chave de seta.
E falando dos modos de condução, a mudança pode ser feita pelo botão logo ao lado do volante, no lado esquerdo. No entanto, o nível de regeneração (são três) só pode ser alterado na tela principal, acessando menus: é um pouco chato, melhor seria um botão externo para a função.
A bateria que alimenta o sistema é do tipo NCM e tem 59,3 kWh (63 kWh brutos), suficientes para 319 km de alcance pelo padrão do PBEV. No entanto, esqueça os números do Inmetro. Durante os dias de avaliação, em todas as condições que utilizamos o carro, a autonomia é bem superior aos dados oficiais. Em uso urbano, a média da nossa avaliação ficou em 15 kWh/100 km (6,6 km/kWh), o que daria 391 km de autonomia. Na condição mais favorável que testamos, os resultados foram ainda melhores, projetando alcance superior a 400 km na cidade - na pior condição, ficou em 350 km.
Apenas para referência, o modelo Skin, uma versão com menos equipamentos e bateria menor avaliada por nós conseguiu uma média de apenas 6,1 km/kWh, ficando abaixo do GT. Como isso foi possível?
O segredo está na composição química das baterias: LFP (lítio-ferro-fosfato) no 03 Skin e NCM (níquel-cobalto-manganês) no 03 GT, sendo que a segunda opção tem maior densidade energética, um dos trunfos para o que o modelo mais caro fosse mais eficiente no consumo de energia. Na prática, isso também garantiu que a diferença de peso entre os dois é quase nula: 1.586 do Skin contra 1.591 kg do GT.
Na hora de recarregar, a Ora 03 GT se vale de uma potência de 11 kW em AC e 68 kW em DC, números em linha com a maioria dos carros elétricos nesta faixa de preço. No caso do BYD Dolphin Plus, apenas para comparação, os números ficam em 11 kW e 67 kW, respectivamente.
Na prática, quer dizer que dá pra recuperar de 20 a 80% da capacidade da bateria em cerca de 3 horas e 30 minutos usando um carregador portátil do tipo wallbox com 11 kW ou cerca de 5 horas com 7 kW de potência. Usando um carregador rápido DC, o tempo para cumprir a tarefa cai para aproximadamente 35 minutos.
Por R$ 184.000, o Ora GT 03 traz um pacote decente de equipamentos, tecnologia e segurança, além do bom acabamento e dirigibilidade que pode ser referência no segmento. Considerando o tipo de uso, peca pelo porta-malas de apenas 228 litros e ausência de alguns botões de atalho para as funções mais usadas, como o ar-condicionado, por exemplo, sem ter que recorrer à tela principal para tudo.
O carro elétrico da GWM ocupa um segmento pouco explorado no momento aqui no Brasil, sendo o rival mais próximo o BYD Dolphin Plus, embora não seja uma briga tão direta. Contra o queridinho da BYD, o 03 GT cativa pelo prazer ao dirigir e comportamento, ficando um pouco atrás em consumo, alcance e espaço no porta-malas.
Dentro da mesma casa, o GT cobra R$ 34 mil a mais relação ao Skin em troca de um pacote mais recheado, com teto panorâmico, assistente de estacionamento, ajuste elétrico dos bancos dianteiros, carregador por indução, e claro, bateria maior: em nossos testes a diferença de autonomia é 277 km para 391 km. Aqui, a escolha é de acordo com as prioridades, mas é inegável que o 03 GT é um carro bem interessante, ainda que tenha pequenos pontos de correção.
GWM ORA 03 GT
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