As duas maiores montadoras europeias, Volkswagen e Stellantis, enfrentam uma crise sem precedentes em 2023. A Volkswagen amargou problemas intermináveis com software, tensões trabalhistas e dificuldades para competir com as chinesas no segmento de elétricos acessíveis e lucrativos. Além disso, sua forte presença na China está sendo corroída pela concorrência local. A situação é tão grave que a empresa pode ser forçada a fechar fábricas na Alemanha pela primeira vez em quase 90 anos.
A Stellantis, conglomerado formado pela fusão da Fiat Chrysler e PSA Peugeot Citroën, enfrenta desafios semelhantes. A falta de uma cultura corporativa unificada e uma série de problemas, como falhas de ignição em modelos como Jeep e Ram – que representam quase metade da receita da empresa –, agravam a situação. Apesar de serem marcas americanas, essas falhas impactam diretamente os resultados da Stellantis.
Uma visão muito mais otimista da situação pode ser vista em um novo relatório da ONG europeia Transport & Environment (T&E), diz que os carros elétricos devem atingir de 20% a 24% das vendas de carros novos em 2025.
Entretanto, a resposta para o local onde esses veículos devem ser fabricados parece cada vez mais ser "a China". Ou até mesmo "montadoras chinesas que instalam fábricas locais na Europa."
A última análise da T&E é notavelmente otimista, não só em termos de vendas de elétricos, mas para as montadoras europeias (e as montadoras que operam na Europa). Atualmente, os elétricos representam cerca de 14% do mercado europeu de carros novos, um número que diminuiu nos últimos meses com o fim dos subsídios para comprá-los.
Portanto, esse salto de 6% a 10% nas vendas em um ano é baseado no excesso de veículos elétricos novos e mais acessíveis que chegarão ao mercado europeu nos próximos meses. "Isso será parcialmente impulsionado por sete novos modelos totalmente elétricos abaixo de € 25.000 (R$ 153.000) que chegaram ou estão chegando ao mercado em 2024 e 2025", disse o relatório da T&E.
As previsões incluem muitas marcas e modelos conhecidos, como o Mini Aceman; os Kia EV3, EV4 e EV5; o novo Mercdes-Benz CLA-Class; os Ford Puma e Capri elétricos; e vários modelos novos e atualizados do conglomerado Volkswagen Group.
É interessante notar a falta de modelos chineses, como os BYD, com a exceção do Leapmotor T03 (que teve ajuda da Stellantis) e da Tesla, que costuma marcar presença com modelos como o Model 3.
Mas, voltando à realidade, o fato é que as montadoras europeias não estão em uma boa situação e não estão bem posicionadas para competir com os veículos elétricos da China em termos de custos.
Isso tudo somado ao fato de que o mercado de automóveis da Europa encolheu consideravelmente nos últimos anos. O tipo de recuperação econômica pós-COVID de que os EUA desfrutaram, mesmo com toda a inflação que sofreram.
"Somos o maior fabricante, com cerca de um quarto da participação de mercado na Europa. Estamos perdendo as vendas de cerca de 500.000 carros, as vendas de cerca de duas fábricas. E isso não tem nada a ver com nossos produtos ou baixo desempenho de vendas. O mercado simplesmente não está mais lá” , disse recentemente o CEO do Grupo Volkswagen. Uma a análise da Just Auto indica que a Volkswagen, a Stellantis e a Renault podem ter agora mais de 30 fábricas entre elas operando em níveis não lucrativos.
Entretanto, uma coisa que movimentará esse mercado novamente é a disponibilidade de novos modelos muito mais baratos. E esses provavelmente virão da China ou de montadoras chinesas e, se não forem híbridos ou híbridos plug-in, serão totalmente elétricos. É exatamente o que está acontecendo agora: as marcas chinesas atingiram um recorde de 11% do total de vendas de veículos elétricos na Europa em junho, mas essas vendas (e as vendas de veículos elétricos em geral) diminuíram à medida que os incentivos se esgotaram e novas tarifas entraram em vigor.
No entanto, espera-se que seja uma queda temporária. Como o Euronews observou este mês, "os fabricantes de automóveis chineses estão se preparando para estabelecer fábricas de produção no exterior para combater as tarifas adicionais impostas por outros países, o que provavelmente aumentará seu volume de vendas a longo prazo".
Interior do BYD Atto 3.
Para Patrick George, do InsideEVs, não há evidências de um "aumento" real nas vendas da Volkswagen ou da Stellantis. Uma década após a crise do dieselgate, que impulsionou a Volkswagen a liderar a transição para os veículos elétricos, a empresa tem demonstrado que muitas das premissas sobre essa mudança eram equivocadas. A dependência de uma cadeia de suprimentos de baterias dominada pela China, as dificuldades em desenvolver software confiável e a rápida ascensão da China como potência automotiva são apenas alguns exemplos.
Embora alguns consumidores europeus tenham mostrado resistência aos carros elétricos chineses, os preços competitivos têm se mostrado um argumento persuasivo. Como destaca a Bloomberg, um consumidor britânico optou por um BYD Yuan Pro, significativamente mais barato que um Tesla Model Y, como seu primeiro carro elétrico:
"Ele simplesmente funciona", afirma Kevin Wood, um britânico de 54 anos que mora em Hampshire e adquiriu seu primeiro carro elétrico no ano passado. Após experimentar um veículo elétrico por meio de um programa de aluguel oferecido por sua empresa, Wood decidiu dar um passo adiante e investir em um modelo próprio. Sua escolha recaiu sobre o Yuan Pro (conhecido como Atto 3 na China), fabricado pela BYD.
Dez meses após a compra, Wood continua encantado com seu SUV elétrico. Ele destaca a autonomia, o manobrabilidade, o conforto dos assentos, o amplo porta-malas e o inovador teto solar com controle por voz como os principais pontos positivos do veículo. Para ele, o Yuan Pro é um "carro genuinamente prazeroso de dirigir".
Espera-se que mais compradores sejam conquistados em breve da mesma forma. É difícil imaginar que as marcas locais da Europa consigam superar a combinação de autonomia, tecnologia e, principalmente, o preço competitivo de marcas como a BYD.
Nos Estados Unidos, porém, a aceitação dessas montadoras pode ser mais desafiadora. A Volkswagen, por exemplo, não parece ter a mesma relevância desde seus tempos áureos com os carros de refrigeração a ar, e muitos se questionam por que o CEO da Stellantis recebe US$ 39 milhões anuais para fabricar veículos que, aparentemente, não estão encontrando compradores.
No entanto, o mais preocupante é que essa situação soa como um aviso – uma prévia de um nível de dificuldade que os EUA ainda não enfrentaram. A indústria automobilística europeia, que emprega milhões de pessoas, pode estar mais em risco do que durante a Grande Recessão, e muitos desses empregos, assim como o padrão de vida que proporcionam, estão sob ameaça.
É difícil imaginar como Volkswagen e Stellantis possam competir com as práticas trabalhistas da China. Contudo, depender de governos europeus para eliminar subsídios a veículos elétricos, afrouxar as rígidas metas de emissões e torcer para que tarifas contra produtos chineses comprem mais tempo não resolve o problema de produzir veículos que possam competir com essa nova concorrência. Além disso, a crise climática não pode esperar por carros mais limpos.
Enquanto isso, a imprensa belga informa que a Audi pode estar em negociações para vender sua fábrica em Bruxelas para a montadora chinesa Nio. Se as coisas continuarem nesse ritmo, podemos ver variações dessa notícia por muito tempo.
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